GERAL

Em 2011, Londres foi sede da WorldSkills International (WSI), maior competição profissional técnica do mundo. Entre tantos competidores, Gabriel D’Espindula representou o Brasil na modalidade de Eletrônica e, com muito foco e determinação, conquistou o Ouro e tornou-se o melhor do mundo nesta modalidade técnica profissional. 

Dez anos depois, Gabriel mora em Gotemburgo, na Suécia, e trabalha com software embarcado em equipamentos médicos. Nesta entrevista pingue-pongue, ele fala sobre sua trajetória profissional e dá dicas para os atletas profissionais que estão se preparando para próxima WS, em 2022: “não subestime as tarefas que parecem fáceis, porque são nessas que todo mundo vacila”. 

Confira a seguir como foi essa conversa e inspire-se com o melhor do mundo! 

 

Quem é Gabriel D’Espindula hoje e quem era Gabriel D’Espindula há dez anos, durante aquela WS? Quantos anos você tinha e quantos anos você tem hoje? 

O Gabriel de hoje tem uns quilos a mais e dor nas costas mais frequentes, tirando isso a essência é a mesma! Brincadeiras à parte acredito que as mudanças que tive entre os 20 e 30 anos de idade são as mesmas que a maior parte das pessoas têm. Estou num ritmo menos frenético, aproveito os tempos livres fazendo nada quando posso e me sinto muito mais seguro e tranquilo. Penso mais em dormir melhor, cuidar da saúde e comer menos porcaria. Mas continuo apaixonado por minha profissão e todos os dias aprendo alguma coisa nova. Eu vejo a competição não somente como o evento em si, que foi em Londres, mas todo o tempo que passei treinando e me preparando, foram no total 3 anos treinando 8 horas ou mais por dia. 

 
Dez anos depois, por onde anda o melhor do mundo em Eletrônica, revelado pelo Senai Paraná na WorldSkills International (WSI), maior competição profissional técnica do mundo? O que você anda fazendo? Pode contar um pouco sobre sua trajetória? 

Eu continuo trabalhando com eletrônica. Atualmente trabalho com software embarcado em equipamentos médicos. Eu estou morando na Suécia, em Gotemburgo. Depois da competição muitas coisas aconteceram! Eu trabalhei no Senai por alguns anos, terminei meu curso de Engenharia, fiz um intercâmbio de um ano para fazer pesquisa em um laboratório de robótica no Japão, casei, entrei em uma sociedade, saí da sociedade, mudei para os Emirados Árabes e trabalhei lá por dois anos treinando alunos para participar da competição da WS e depois mudei aqui para a Suécia. Aqui comecei trabalhando em uma empresa de consultoria, me envolvi em diferentes projetos e depois mudei para minha empresa atual. Nesse tempo todo eu fiz vários projetos em várias áreas, tem sido bem legal. Dez anos é bastante tempo, mas as lembranças da época da competição me marcaram bastante e foi uma época bem especial para mim. 

 
Na época, como foi para você participar da WS e ser revelado o melhor do mundo? Você imaginava essa conquista? 

Eu nunca participei para perder, entrei para ganhar, e esse precisa ser o espírito do competidor. De qualquer forma nunca pensei muito no título do melhor do mundo, eu abstraí um pouco essa ideia, na hora da competição eu precisava apenas cometer o mínimo possível de erros, e torcer para os outros errarem mais do que eu. O nível exigido na competição é bem alto, eu precisava saber tudo de basicamente todas as áreas da eletrônica, desde soldar placas à programação, entender de eletrônica de potência, rádio, amplificadores, sensores, circuitos de filtro, circuitos digitais, roteamento de placas, realização de medidas utilizando os instrumentos, tudo mesmo. Durante todo o tempo treinando eu estava mais interessado em aprender o máximo possível de tudo, dominar todas as ferramentas, ser mais rápido, entender e ser capaz de projetar todos os circuitos. O resultado da competição foi uma consequência dessa base sólida que criei com o treinamento, nisso só tenho a agradecer ao meu treinador Edson Vander, que proporcionou o ambiente ideal para eu conseguir crescer e me manter motivado durante esses 3 anos. Na hora da competição a gente esquece do mundo e foca. Eu fiquei nervoso até a hora que comecei a ler a prova, naquele momento me senti em casa e sabia exatamente o que eu precisava fazer. A minha forma de estar mentalmente preparado foi fazer o possível para mitigar o risco de encontrar algo que eu não conhecia durante a prova, e isso acabou dando certo, eu conhecia tudo de todas as provas e no fim acabei ganhando.  

 
Que portas podemos dizer que essa competição e esse resultado abriram para você? 

A competição sem dúvidas abriu muitas portas, mas não somente pelo resultado em si, todo esse conhecimento adquirido me ajudou muito a crescer profissionalmente. Além do diferencial no currículo, a bagagem me faz encontrar soluções que às vezes outras pessoas não conseguem ver tão facilmente. Um bom profissional precisa ter espaço para aprender e o que eu tive foram três anos dedicados para eu aprender tudo o que pude. Eu era uma esponja, tinha um laboratório à disposição para projetar, estudar, tentar; cometer erros e fazer qualquer coisa. Foi excepcional. 

 
A partir de que curso você começou a desenhar a sua carreira? 

Eu fiz um curso de aprendizagem em eletrônica industrial. Entrei no Senai porque comecei a montar circuitos de pedais de guitarra e amplificadores quando era adolescente, mas eu montava projetos de revistas e da internet, não entendia como eles funcionavam, então minha mãe sugeriu que eu procurasse o Senai. Na época tinha um processo seletivo e depois de iniciar o curso éramos encaminhados para empresas. Meu primeiro emprego foi como menor aprendiz e eu gostei muito. Hoje tenho 30 anos e posso dizer que tenho 14 anos de experiência desde que assinei minha carteira de trabalho pela primeira vez. Acho que infelizmente esse é um caminho tão bom, mas tão pouco explorado pelos jovens, muitos completam 17 anos e pensam em entrar para a universidade sem nem saber qual curso. Eu não tive esse problema, já entrei na universidade com outra cabeça, entendia o que era a profissão, e acabei aproveitando até melhor o curso superior. Tive também colegas que após finalizarem o curso de aprendizagem não seguiram com a eletrônica, mas depois de passar pela experiência sabiam qual caminho queriam seguir, porque foram expostos ao mercado de trabalho.  

 
Como a questão da Eletrônica está posicionada hoje no mercado de trabalho? É uma área que vale à pena e que pode ser iniciada a partir de um curso técnico? 

A gente está vivendo no futuro, tudo está conectado. Cada dia mais coisas têm eletrônica embarcada, sem dúvida é uma área muito boa, mas eu sou suspeito para falar do assunto. O curso técnico é uma ótima opção para aprender um pouco de tudo em um curto período de tempo, e no final, a pessoa tem uma profissão. O que eu mais gosto do curso técnico ou de aprendizagem é que eles são bem práticos, comparando com a Engenharia, e eu gosto mais de trabalhar com circuitos do que com excel. 

 
Como você vê hoje a questão do Curso Técnico? Foi o começo de tudo para você? Depois desta formação, como seguiu a sua formação profissional? 

Acredito que o curso técnico é bem democrático, tanto jovens que estão no ensino médio quanto pessoas mais velhas que já trabalham na indústria em alguma outra área, mas gostariam de se especializar acabam ingressando. Alguns acabam fazendo um curso superior depois, mas nem todos; e mesmo assim há oportunidades na indústria. No meu caso, eu cursei Aprendizagem enquanto estava no ensino médio e quando acabei o curso entrei na universidade. Fiz um intercâmbio durante a universidade, o chamado curso sanduíche. Como é uma área bem dinâmica, eu nunca posso parar de me atualizar, preciso sempre aprender novas tecnologias, novas linguagens de programação, novas normas, é uma área que muda bastante. Mais recentemente como passei a ser responsável por software embarcado em dispositivos médicos precisei aprender muita coisa sobre normas, regulamentação, métodos de trabalho, algumas linguagens de programação, cibersecurity, enfim, nunca posso parar no tempo. 

 
Pode contar um pouco em relação aos projetos que você já trabalhou e no que está trabalhando atualmente? 

Eu já fiz de tudo! No início eu fazia pedais de guitarra, depois na época do treinamento eu fazia vários pequenos projetos como medidores de batimentos cardíacos, inversor de frequência para motores, sensor de cores, painel de leds, balança, sensores de nível, sensores de distância, amplificadores de áudio, robôs móveis, temporizadores, alarmes, rádio transmissores, receptores de rádio, equalizadores de áudio, relógios, bússolas eletrônicas, sensores de temperatura, controladores de temperatura, etc. Meu TCC do curso de aprendizagem foi um carrinho de controle remoto onde o controle era um mini volante com acelerômetro. No intercâmbio eu fiz o hardware e software embarcado de uma espécie de microscópio robótico que era usado para manipular células. Meu TCC da universidade foi um dispositivo para bater ponto remoto, que utiliza um sensor biométrico. Na época que fazia parte da sociedade, nós montamos algumas máquinas industriais e projetamos uma impressora 3D. Como freelancer fiz também projetos como um EEG (eletroencefalograma) bluetooth, um smart ring (anel que detectava gestos) e fiz também algumas coisas relacionadas a smart home. Aqui na Suécia eu trabalhei projetando um sensor laser para alinhamento de correias e atualmente trabalho com projetos de equipamentos médicos relacionados ao intestino e bexiga. 

 
Que dicas e conselhos você gostaria de dar aos novos competidores do Senai Paraná na WS? Tem alguma dica especial para o dia da competição? 

A dica é o que eu sempre pensava quando competidor: enquanto vocês dormem alguém no Japão está treinando. E para o dia da competição eu diria para não subestimar as tarefas que parecem fáceis, porque são nessas que todo mundo vacila. Além disso, acho que é importante ter uma relação boa com o treinador; o treinador é fundamental no processo e os competidores devem confiar muito nos seus treinadores, eles têm experiência e sabem o que estão falando. 

 
Quais são seus próximos passos e expectativas de futuro? 

Nunca me planejei muito profissionalmente, sempre gostei de novos desafios e de aprender sobre diferentes áreas. Atualmente estou muito feliz em meu emprego, a área médica é bem legal, os projetos que eu contribuo causam um impacto muito positivo na vida das pessoas e eu acho bem gratificante. Atualmente eu tenho gostado também de trabalhar com pessoas mais velhas; no meu grupo de trabalho eu sou o mais novo e é ótimo, eles lidam muito melhor com problemas e sabem balancear a vida profissional com vida pessoal de uma forma bem mais saudável. Gostaria de poder voltar ao Brasil ainda algum dia, mas por enquanto estou aproveitando aqui. 

 
E qual o recado final que você gostaria de deixar? 

Uma coisa importante é lembrar que meu resultado na verdade foi não somente meu, mas de muitos envolvidos no processo, o Vander que foi meu treinador conseguiu antes de mim 2 alunos ganhando prata e um ganhando bronze nas competições nacionais. Um desses competidores que ganhou prata foi meu antecessor direto. Sem esse know-how seria impossível para mim chegar tão longe. Além do Vander, na época o Alaer era o gerente da unidade do Senai e ele apoiou muito meu treinamento também. Com o tempo cada vez mais pessoas foram entrando nesse processo e a medalha de ouro só se concretizou devido a esse trabalho de todos no Senai CIC, Senai Paraná e depois no Departamento Nacional do Senai, que fez vários simulados para me preparar também. Durante o treinamento eu tive que trancar minha faculdade para focar somente no treinamento, e eu não gostei nem um pouco de fazer isso. O único motivo pelo qual eu de fato tranquei a faculdade e continuei foi porque percebi que eu não estava ali mais representando o Gabriel, eu estava representando o Senai CIC, depois eu estava representando o Paraná e depois eu estava representando o Brasil. Dar valor a essas pessoas envolvidas em todo esse processo é muito importante. Quando eu subi no pódio, foi a afirmação que somos capazes de chegar lá, mais alto do que Japão, Taiwan, Suíça, ou qualquer outro país desenvolvido. Mas só conseguimos chegar lá por conta desse trabalho contínuo feito por essas pessoas especiais que criam as condições da tempestade perfeita. O competidor é importante, mas mesmo o melhor competidor, se não tiver as pessoas certas ao redor, não consegue chegar lá. 

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