Microplásticos no solo: Um desafio invisível, mas urgente

Por Gabriel dos Santos da Cruz
Quando pensamos em poluição plástica, a imagem que costuma surgir é a de oceanos repletos de garrafas PET e sacolas boiando. No entanto, o solo — base da produção de alimentos e do equilíbrio ecológico — tornou-se um dos principais destinos desses resíduos. Os microplásticos, fragmentos menores que 5 mm oriundos da degradação de plásticos maiores ou fabricados nessa escala, estão silenciosamente se acumulando nos ambientes terrestres, com impactos ainda pouco compreendidos, mas potencialmente graves.
Como os microplásticos chegam ao solo?
As rotas de entrada são variadas e, muitas vezes, passam despercebidas. Práticas agrícolas como o uso de filmes plásticos para cobertura, lodo de esgoto como fertilizante e irrigação com água contaminada são grandes vetores de contaminação. Estima-se que a carga de microplásticos no solo supere em muito a encontrada nos oceanos. A decomposição lenta dos plásticos, aliada à sua intensa aplicação em atividades humanas, intensifica essa presença, com concentrações que já chegam a milhares de partículas por quilo de solo em áreas agrícolas.
Impactos físicos, químicos e biológicos
No solo, os microplásticos não são apenas resíduos inertes. Eles podem alterar propriedades físicas como densidade, porosidade e retenção de água, o que afeta diretamente a capacidade produtiva do solo. Do ponto de vista químico, há registros de mudanças no pH, na disponibilidade de nutrientes como nitrogênio e fósforo e até no acúmulo de metais pesados, já que os microplásticos têm alta capacidade de adsorver poluentes.
A dimensão biológica talvez seja a mais preocupante. A presença de microplásticos interfere na atividade microbiana e nas comunidades de fungos e bactérias, além de afetar a reprodução de organismos essenciais ao equilíbrio ecológico, como minhocas e colêmbolos. Além disso, há evidências de que esses materiais podem ser absorvidos pelas raízes e transportados para os tecidos das plantas, trazendo implicações para a segurança alimentar.
Biodegradáveis: solução ou novo problema?
Diante das críticas aos plásticos convencionais, surgiram os chamados plásticos biodegradáveis. Embora vendidos como uma solução ambientalmente amigável, estudos recentes mostram que eles também se fragmentam em microplásticos biodegradáveis, que podem ser igualmente persistentes no solo e tóxicos para a biota. Em vez de desaparecerem, esses materiais apenas mudam de forma, mantendo-se ativos no ambiente.
Caminhos para a ação: ciência, inovação e responsabilidade
Os desafios são muitos e a ciência ainda está em fase inicial no que se refere à compreensão total dos efeitos dos microplásticos nos solos. No entanto, algumas ações são possíveis: regulamentar o uso de plásticos na agricultura, investir em tecnologias de degradação segura, melhorar o tratamento de resíduos urbanos e, sobretudo, promover políticas públicas que priorizem o uso consciente dos materiais plásticos. A integração entre ciência, setor produtivo e sociedade será essencial para enfrentar esse problema invisível, porém urgente.
Por meio da equipe do Instituto Senai de Tecnologia em Meio Ambiente e Química (IST MAQ), em parceria com uma empresa do setor, foi desenvolvido o projeto 'Elaboração de Índice de Reciclabilidade'. O objetivo é criar um índice aplicável a um portfólio de cosméticos, com uma estrutura flexível e adaptável, que sirva como base estratégica para medir e melhorar a reciclabilidade dos produtos — desde a produção até o pós-consumo — contribuindo para o cumprimento das metas de circularidade da Agenda 2030.