Como a economia circular está moldando o futuro industrial?

Insights06/05/2025
Pesquisa mostra que 85% das indústrias brasileiras já aplicam ações circulares e os impactos positivos vão do meio ambiente à geração de empregos
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Na contramão do modelo linear tradicional de produção e consumo — aquele baseado em extrair, produzir, consumir e descartar — cresce no Brasil e no mundo o conceito de economia circular. Mais do que uma tendência, trata-se de uma mudança profunda na forma como usamos os recursos naturais, produzimos bens e lidamos com os resíduos. Seu foco está em manter os produtos, materiais e recursos em uso pelo maior tempo possível, criando ciclos contínuos de reutilização, reparo, renovação e reciclagem.

Esse modelo propõe uma ruptura estratégica com a lógica linear, substituindo a ideia de "fim de vida" dos produtos por um novo ciclo produtivo que prioriza a eliminação de resíduos e da poluição desde o design, a circulação de materiais em seu maior valor e a regeneração dos sistemas naturais. A economia circular, portanto, não é apenas uma resposta à crise ambiental, mas também uma oportunidade econômica — especialmente para o setor industrial.

Vantagens para a indústria

A aplicação da economia circular no setor industrial vai muito além da sustentabilidade ambiental: ela representa ganhos operacionais, competitivos e institucionais. Uma das principais vantagens é a redução de custos operacionais, uma vez que o uso de matérias-primas recicladas e a reinserção de subprodutos no ciclo produtivo minimizam os gastos com insumos virgens e a destinação de resíduos.

Além disso, a circularidade abre espaço para novas fontes de receita. Aquilo que antes era considerado descarte pode se tornar matéria-prima para outras empresas ou ser transformado em novos produtos com valor agregado. O modelo também contribui para o cumprimento de legislações ambientais, como a Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS), e normas internacionais, facilitando o acesso a mercados externos e financiamentos.

Do ponto de vista da inovação e competitividade, o estímulo à criação de novos processos e produtos mais sustentáveis se alinha aos critérios ESG (Ambiental, Social e Governança), valorizados por investidores e consumidores. A otimização no uso de recursos também resulta em menor pegada de carbono, atendendo à demanda global por uma economia de baixo carbono.

A economia circular também fortalece a imagem institucional, agregando valor à marca e promovendo um posicionamento mais responsável no mercado. E não menos importante: ela contribui diretamente para a geração de empregos, especialmente em novas cadeias produtivas como as de reparação, remanufatura e reciclagem.

Impacto direto na redução de emissões

A transição para a economia circular tem impacto direto na mitigação das mudanças climáticas, atuando em diferentes frentes. Ao reutilizar e reciclar materiais, a demanda por matérias-primas virgens diminui — e com ela, as emissões associadas à extração, mineração e desmatamento. Na indústria têxtil, por exemplo, a reutilização de fibras pode reduzir as emissões em até 50%.

Em termos energéticos, os processos circulares são frequentemente mais eficientes. Um exemplo emblemático é o do alumínio: a reciclagem desse metal consome até 95% menos energia do que sua produção a partir da bauxita. Já o design sustentável — com produtos duráveis, modulares e de fácil reparo — reduz a necessidade de substituições constantes, economizando materiais e energia.

Outras estratégias, como a logística reversa, evitam o descarte inadequado e permitem a reinserção de resíduos na cadeia produtiva. A redução da destinação de resíduos a aterros também contribui para a diminuição das emissões de metano — um gás com potencial de aquecimento 28 vezes maior que o CO₂.

Além disso, empresas que adotam práticas circulares podem acessar créditos de carbono ao comprovar a redução de emissões, criando um ciclo virtuoso onde os benefícios ambientais se convertem em ganhos econômicos. Setores como a construção civil e o agronegócio têm papel-chave: a reutilização de concreto, aço e outros materiais pode reduzir significativamente as emissões de um setor responsável por cerca de 40% do CO₂ global.

Números que mostram o avanço no Brasil

A adoção da economia circular no Brasil já é uma realidade palpável. Uma pesquisa recente da Confederação Nacional da Indústria (CNI), em parceria com o Centro de Pesquisa em Economia Circular da USP, revelou que 85% das indústrias brasileiras já adotam pelo menos uma prática circular.

O levantamento, realizado entre maio e julho de 2024 com 253 indústrias dos setores de transformação e construção, mostrou que 68% dos empresários reconhecem que essas práticas contribuem para a redução das emissões de gases de efeito estufa, reforçando a importância do modelo para o combate às mudanças climáticas.

O estudo também mapeou as principais ações adotadas pelas indústrias brasileiras. Entre as mais recorrentes estão:

  • 50% possuem programas de sustentabilidade consolidados;
  • 42% desenvolvem produtos com potencial de recuperação;
  • 42% substituem materiais virgens por reciclados;
  • 41% criam produtos que minimizam perdas de energia e insumos durante todo o ciclo de vida;
  • 40% investem em design de produtos mais duráveis;
  • 31% adotam práticas formais de reciclagem;
  • 26% praticam logística reversa;
  • 40% reutilizam efluentes tratados na produção.

Esses dados mostram que a indústria nacional já enxerga o valor estratégico da circularidade, não apenas como uma ação ambiental, mas como uma vantagem competitiva concreta.

Com potencial para reduzir até 39% das emissões globais de gases poluentes até 2032, segundo estudos internacionais, a economia circular é uma das principais aliadas da indústria na construção de um futuro sustentável.

A aplicação dos conceitos de Economia Circular tem ganhado força nas indústrias brasileiras com o apoio do Instituto Senai de Tecnologia em Meio Ambiente e Química, que vem protagonizando soluções inovadoras para transformar resíduos em novos insumos de valor. Um exemplo é a conversão de lodo de estações de tratamento de efluentes em fertilizante, desenvolvida em parceria com o ISI Eletroquímica, que possibilita o reaproveitamento de um passivo ambiental em benefício da agricultura.

Outro destaque é a recuperação de nutrientes presentes em efluentes industriais, que são captados e transformados em insumos para uso agrícola, reduzindo a dependência de fertilizantes convencionais. A produção de biocarvão a partir de caroços de azeitonas também evidencia o potencial de resíduos agroindustriais como fontes de energia limpa e sustentável. Complementando esse portfólio de soluções circulares, o instituto desenvolveu, em conjunto com o IST Construção Civil, tecnologias para a produção de fertilizante e gesso ecológico a partir de ácido sulfúrico reciclado, mostrando que a sinergia entre setores e o reaproveitamento de subprodutos são caminhos viáveis para reduzir impactos ambientais e gerar novos negócios sustentáveis.